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Ernst Röhm, oficial
nazista que era homossexual assumido.1
Os homossexuais constituíam um dos grupos perseguidos
pelo regime nazista. Antes do Terceiro Reich, Berlim era considerada uma cidade liberal, com bares e cabarés
frequentados pela comunidade homossexual. Magnus Hirschfeld tinha começado aí, um movimento
pelos direitos dos homossexuais durante o virar do século. Contudo, estes
movimentos foram duramente reprimidos pelo Partido Nazi.
A ideologia nazi sustentava que a homossexualidade era
incompatível com o Nacional Socialismo,
já que não permitia a reprodução, necessária para perpetuar a raça superior. A
masturbação era considerada perniciosa pelo Reich.
Ernst Röhm, líder da Sturmabteilung (SA), a primeira milícia do
Partido Nazi, um dos homens de confiança de Hitler que o ajudou a ascender ao poder, era
homossexual e foi assassinado em 1934 na Noite das Facas Longas.
O mesmo se passava com outros líderes, como Edmund Heines.
Hitler protegeu, inicialmente, Röhm de outros elementos
do Partido Nazi que consideravam a sua homossexualidade como uma violação grave
da política fortemente homofóbica do partido. Hitler, mais tarde, ao considerar
que esta podia ser, de facto, uma ameaça à consolidação do partido no poder,
autorizou a sua execução na chamada Noite das facas longas.
Durante o holocausto, a perseguição continuou, tendo muitos
sido enviados para campos de concentração. As estimativas sobre o número de
homossexuais mortos nos campos varia muito, entre 5 e 15 mil, consoante os
autores consultados.
O sofrimento dos homossexuais não terminou depois do
fim da guerra, uma vez que as leis anti-homossexuais dos Nazis não foram
suprimidas, tal como aconteceu com as leis anti-semíticas, por exemplo. Alguns
homossexuais foram obrigados a terminar a pena a que estavam condenados pelo
Governo Militar Aliado do pós-guerra na Alemanha. Outros, ao regressar a casa e
aos seus países de origem tiveram que manter o silêncio sobre o seu sofrimento,
por medo de discriminação, pois as chamadas leis sobre a sodomia só acabariam por cair na Europa Ocidental
nos anos 1960 e 1970.
Introdução
Depois da Primeira Guerra
Mundial, no período da história alemã conhecido como a República de Weimar,
a homossexualidade
masculina na Alemanha, particularmente em Berlim, gozavam de maior liberdade e aceitação do que em
qualquer outra parte do mundo. Contudo, a partir da tomada de poder por Hitler, os gays e, em menor grau, as lésbicas, passaram a ser dois de entre vários
grupos sociais a serem atacados pelo Partido Nazi, acabando por ser também vítimas do Holocausto.
A partir de 1933, as organizações gays foram
banidas, livros académicos sobre homossexualidade e, mais genericamente, sobre sexualidade humana, foram queimados, e alguns
homossexuais do Partido Nazi foram assassinados. A Gestapo compilou listas de nomes de homossexuais,
que foram obrigados a adaptar-se à norma sexual Nazi.
Estima-se que em 1928
existiam cerca de 1,2 milhões de homossexuais na Alemanha. Entre 1933
e 1945, mais de 100 mil homens foram registados
pela polícia como homossexuais (as "Listas Rosa"), e destes,
aproximadamente 50 mil foram oficialmente condenados. A maior parte destes
homens foi aprisionado e entre 5 a 15 mil enviados para campos de concentração.
O investigador Ruediger
Lautman acredita que a taxa de mortalidade de homossexuais presos em
campos de concentração poderá ter atingido os 60%, pois os homossexuais presos
nesses "campos da morte" para além de serem tratados de forma
extraordinariamente cruel pelos guardas, eram também perseguidos pelos outros
prisioneiros.
Depois da guerra, o sofrimento dos homossexuais nos
campos de concentração nazi não foi reconhecido em muitos países, tendo algumas
potências aliadas recusado a libertação ou repatriação destes homens. Alguns
dos que ficaram presos, escaparam e foram de novo presos, baseados em factos
ocorridos durante no período nazi. Apenas nos anos 1980 começaram a surgir
governos a reconhecer os homossexuais como vítimas do Holocausto, e apenas em 2002
o governo alemão pediu formalmente desculpa à comunidade gay.
Este período da história mantém-se, contudo, rodeado
em controvérsia. Em 2005, o Parlamento Europeu
adoptou uma resolução relacionada com o Holocausto em que a perseguição nazi
aos homossexuais não foi referida.
A subida do Nazismo ao poder
Antes do Terceiro Reich, Berlim era considerada uma cidade liberal, com numerosos cabarés, clubes nocturnos e bares gays, onde
berlinenses e turistas (gays ou não) se divertiam com espectáculos de travesti. Hitler, no seu livro Mein Kampf, denunciou estes costumes como prostituição, sífilis e degeneração cultural, responsabilizando
parcialmente os judeus.
Por essa época, Berlim era sede das organizações
LGBT mais dinâmicas e activas do mundo. O médico judeu Magnus Hirschfeld fundou em 1897,
com Eduard Oberg,
Max Spohr e Franz
Josef von Bülow, o Comité Científico Humanitário (Wissenschaftlich-humanitäre
Komitee), com o objectivo de lutar contra o Parágrafo 175 que ilegalizava as relações sexuais
entre homens e de obter o reconhecimento para os homossexuais e transgêneros, que é considerada a primeira
organização pública de defesa dos direitos dos gays.
Estes progressos da comunidade gay foram rapidamente
eliminados com a chegada ao poder do Partido Nazi de Hitler.
O nazismo declarou a sua
incompatibilidade com a homossexualidade pois os gays não se reproduziam e,
logo, não perpetuavam a raça ariana. Pelas
mesmas razões, a masturbação foi também
considerada prejudicial ao Reich, mas seria apenas ligeiramente reprimida. Os
nazis temiam ainda o "contágio" gay.
Hitler acreditava que a homossexualidade era um
"comportamento degenerativo" que ameaçava a capacidade do estado e o
"carácter masculino" da nação. Os homens gays eram denunciados como "inimigos
do estado" e acusados de "corromper" a moral
pública e ameaçar o crescimento populacional alemão.
Os líderes nazis, como Himmler, consideravam também que os homossexuais
eram uma raça à parte e promoveram experiências médicas que tentavam encontrar
alguma deficiência hereditária que muitos membros do partido julgavam ser a
causa da homossexualidade. Enquanto muitos líderes nazis defendiam que os
homossexuais deviam ser exterminados, outros pretendiam legislação que banisse
sexo entre homens ou entre mulheres.
Ernst Röhm, o chefe da SA que Hitler considerava uma ameaça potencial,
manteve a sua homossexualidade oculta até que em 1925
um jornal do Partido Social Democrático da Alemanha publicou um conjunto das
suas cartas de amor para outros homens. A partir dessa altura, Röhm deixou de
esconder a sua sexualidade (tal como Edmund Heines e outros líderes da SA), aderindo
mesmo à Liga dos Direitos Humanos, a maior organização alemã de direitos dos
homossexuais.
Os judeus alemães tiveram papel proeminente nos
movimentos pelos direitos dos gays na Alemanha. A comunidade de artistas e
realizadores de cinema judeus na Alemanha tinha, nessa época, uma grande
concentração de homossexuais. Os judeus alemães, como Magnus Hirschfeld, foram duramente criticados.
Foram demonizados pelas suas ideias controversas que eram chocantes para muita
gente na Europa. Apesar de não estar envolvido nos debates em curso na
Alemanha, Sigmund Freud, um
judeu austríaco, também foi acusado pelos nazis devido às suas ideias
controversas sobre sexualidade, particularmente sobre alguns dos seus conceitos
incestuosos como o complexo de Édipo
ou o complexo de Electra.
Expurgo
Em 10 de maio de 1933,
em Berlim, nazistas queimaram obras de autores de origem judaica, a biblioteca
do Institut für
Sexualwissenschaft, e outras obras consideradas
"não-alemãs".
Em finais de fevereiro de 1933,
à medida que a influência moderadora de Ernst Röhm enfraquecia, o Partido Nazista lançou
uma expurgo dos clubes homossexuais (gays, lésbicas e bissexuais, nessa altura
conhecidos como "homófilos")
de Berlim, ilegalizou as publicações de conteúdo sexual e baniu as organizações
gays. Em consequência, muita gente abandonou a Alemanha (incluindo, por
exemplo, Erika Mann). Em março de 1933,
o principal administrador do Institut für
Sexualwissenschaft (Instituto para o Estudo da Sexualidade), Kurt Hiller, foi internado num campo de concentração.
A 6 de maio de 1933,
a Deutsche
Studentenschaft organizou um ataque ao Instituto. Alguns dias depois
a biblioteca e os arquivos do Instituto foram levados e publicamente queimados
em Opernplatz ("Praça da Ópera", em
Berlim). Cerca de 20 mil livros e revistas científicas, 5 mil fotografias e
imagens, foram destruídos. Os nomes e endereços dos ficheiros do Instituto
foram, também por essa altura, confiscados. Joseph Goebbels aproveitou a ocasião para, perto
da fogueira, fazer um discurso político para uma multidão de 40 mil pessoas. Os
líderes da Deutsche Studentenschaft proclamaram os seus Feuersprüche
(decretos de fogo, "contra o espírito antialemão"), que levaram a que
os livros de autores Judeus, mas também os livros antimilitaristas (como os de Erich Maria Remarque),
fossem retirados das livrarias públicas e da Universidade de Humboldt para
serem também queimados. O activista radical Adolf Brand foi dos poucos que não abandonou o
país, mantendo-se corajosamente na Alemanha por mais cinco meses, após a queima
dos livros. No entanto, a perseguição que lhe foi movida acabou por levá-lo de
vencida e, em novembro de 1933, foi forçado a anunciar o fim dos movimentos
organizados de emancipação sexual na Alemanha.
Na noite de 29 de junho de 1934,
Hitler promoveu a Noite das Facas Longas,
participando pessoalmente na prisão de Ernst Röhm, o líder da SA ("camisas pardas") que
posteriormente seria assassinado conjuntamente com dezenas de outros oficiais.
A homossexualidade de Röhm e dos seus oficiais foi utilizada por Hitler para
aplacar a fúria que se apoderou das fileiras da SA. A esta purga seguir-se-ia o
endurecimento da legislação contra a homossexualidade e a prisão de
homossexuais com auxílio, ao que parece, da lista de nomes obtida no Instituto.
Muitos milhares de prisioneiros acabaram em campos de concentração; outros,
como John Henry Mackay,
suicidaram-se.
Heinrich Himmler,
que tinha inicialmente apoiado Röhm com o argumento que as acusações de
homossexualidade contra ele eram maquinações judias, tornou-se muito activo na
repressão aos homossexuais. Declarou: "Temos que exterminar esta gente
pela raíz (...); os homossexuais têm de ser eliminados2 ."
Pouco depois da purga de 1934,
uma divisão especial da Gestapo foi instruída para
compilar uma lista de homens gays. Em 1936,
Heinrich Himmler, chefe da SS, criou o "Gabinete Central do Reich para
o Combate à Homossexualidade e ao Aborto."
Inicialmente os homens gays não tiveram o mesmo
tratamento que os judeus; a Alemanha Nazi incluía os gays alemães como parte da
raça ariana pura e tentou forçá-los à
conformidade sexual e social. Os homens gays que não quisessem fingir uma
mudança de orientação sexual
eram enviados para campos de concentração ao abrigo da campanha de Arbeit macht Frei ("Libertação pelo
Trabalho)."
Mais de um milhão de gays alemães foram identificados,
dos quais cerca de 100 mil foram acusados e 50 mil condenados a penas de prisão
por homossexualidade3 . Centenas de homens gays que viveram sob
ocupação nazi foram castrados por ordem dos tribunais4 .
Muitos dos perseguidos ao abrigo dessas leis nunca se
identificaram como gays. De facto, tais leias "anti-homossexuais"
mantiveram-se depois da guerra por todo o mundo ocidental até aos anos 1960 e
1970, de tal forma que muitos gays nunca se sentiram confortáveis para contar
suas histórias de sofrimento à mão dos Nazis até aos anos 1970, quando a
maioria dos países suprimiu as leis relacionadas com a sodomia.
Campos de concentração
As estimativas variam fortemente quanto ao número de
homens gays que morreram nos campos de concentração durante o Holocausto,
situando-se entre os 5 e os 15 mil. Os números mais elevados incluem gays que
eram judeus e/ou comunistas. Os registos
referentes às razões do internamento em muitos casos não existem, tornando
difícil estimar com precisão quantos homens gays pereceram nos campos da morte
(ver triângulo rosa).
Os homens gays sofreram tratamentos invulgarmente
cruéis nos campos de concentração. Além de serem agredidos pelos guardas
alemães, eram perseguidos muitas vezes também pelos outros prisioneiros. Sob a
política Arbeit macht frei
("Libertação pelo Trabalho") nos campos de trabalhos forçados,
recebiam regularmente os trabalhos mais pesados ou perigosos. Os soldados da SS
utilizaram muitas vezes o triângulo rosa5 , que os homens gays eram obrigados a
usar, como alvo para prática de tiro.
Esse tratamento cruel pode ser atribuído tanto às
opiniões dos guardas da SS como às atitudes homofóbicas generalizadas na sociedade alemã da
época. A marginalização dos gays na Alemanha reflectia-se nos campos de
concentração. Muitos foram espancados até a morte por outros prisoneiros.
Outros morreram às mãos de médicos nazis em experiências
"científicas" destinadas a localizar o "gene gay" de forma
a encontrar "curas" para as futuras crianças arianas que fossem gays.
Pierre Seel, um
sobrevivente francês gay do Holocausto, teve a coragem de contar as suas
experiências sob controlo Nazi. Quando estes subiram ao poder e ocuparam a sua
cidade natal, Mulhouse, na Alsácia-Lorena, o seu nome constava de uma lista
de gays e ele foi mandado apresentar na esquadra da polícia. Obedeceu para
proteger a sua família de possíveis retaliações. Ao chegar à esquadra, ele e
outros homens gays foram espancados. A alguns, que tentaram resistir, foram-lhe
arrancadas as unhas. Outros foram violados com réguas de madeira partidas e
tiveram os intestinos perfurados, causando graves hemorragias. Depois de ser
preso, foi enviado para o campo de concentração de Schirmeck, onde foi forçado
a assistir, conjuntamente com os outros prisioneiros em formatura, à execução
do seu jovem namorado de Mulhouse que tinha apenas dezoito anos. Steel conta que
os guardas o despiram completamente, enfiaram-lhe um balde de metal na cabeça e
atiçaram os seus cães pastores alemães,
que o morderam até a morte.
Esses tratamentos cruéis explicam a alta taxa de
mortalidade dos homens gays nos campos de concentração quando comparada com a
de outros "grupos anti-sociais". Um estudo de Ruediger Lautmann
concluiu que 60% dos homens gays internados em campos de concentração não sobreviveram,
comparado com 41% dos prisioneiros políticos e 35% de Testemunhas de Jeová.
O estudo refere também que as taxas de sobrevivência de homens gays foram
ligeiramente maiores para os que eram originários das classes média ou alta ou
para os que eram bissexuais casados e com filhos.
Pós-Guerra
O Homomonument
em Amsterdã, Países Baixos, feito em homenagem aos homossexuais mortos pela Alemanha nazista.
Os prisioneiros homossexuais dos campos de
concentração não foram considerados vítimas de perseguição Nazi a seguir à
guerra6 . As indemnizações e pensões sociais
atribuídas a outros grupos de prisioneiros foram negadas aos gays, que
continuavam a ser considerados criminosos — as leis antigay nazis apenas foram
banidas em 1994, embora tanto a Alemanha Ocidental
como a Alemanha Oriental
tenham liberalizado as suas leis criminais contra a homossexualidade entre
adultos nos finais dos anos 1960.
Os sobreviventes gays do Holocausto podiam ser
re-encarcerados por "ofensas repetidas", e foram mantidos nas listas
de "criminosos sexuais". Sob o Governo Militar Aliado da Alemanha, a
seguir ao final da Guerra, alguns homossexuais foram forçados a cumprir as suas
penas de prisão até o fim, independentemente do tempo passado em campos de
concentração.
As políticas antigay dos nazis e a sua destruição dos
primeiros movimentos pelos direitos dos gays não foram considerados objectos
dignos de estudo pelos historiadores e académicos que se debruçaram sobre o
Holocausto. Apenas nos aos 1970 e 1980 começaram a surgir algumas abordagens ao
tema, com sobreviventes do Holocausto a publicar as suas memórias, peças de
teatro como Bent, pesquisa académica e documentários sobre a
homofobia Nazi e a destruição das organizações pelos direitos dos gays.
Em 2005, o Parlamento Europeu
assinalou o 60.º aniversário da libertação do campo de concentração de Auschwitz-Birkenau
com um minuto de silêncio
e a aprovação de uma resolução que incluía o seguinte texto:
...27 de Janeiro de 2005, o sexagésimo aniversário
da libertação do campo de morte de Auschwitz-Birkenau na Alemanha Nazi, onde
um total de até 1,5 milhões de judeus, ciganos, polacos, russos e
prisioneiros de outras nacionalidades, e homossexuais, foram assassinados, é
não só uma ocasião suprema para que os cidadãos europeus relembrem e condenem
o enorme horror e tragédia do Holocausto, mas também para salientar o
perturbador aumento do antissemitismo, e
especialmente dos incidentes antissemitas na Europa, e para aprender de novo
as abrangentes lições sobre os perigos de discriminar pessoas com base na
raça, na etnia, na religião, na posição social, nas opções políticas ou na
orientação sexual,...
|
Em 6 de maio de 2008, uma rua de Berlim receberá o
nome de Magnus Hirschfeld, precisamente na margem oposta do rio Spree, onde se situava o Instituto para o
Estudo da Sexualidade. É a data do 75.º aniversário da destruição do Instituto,
em 1933. E a 27 de maio de 2008 deverá ser inaugurado oficialmente o memorial
de Berlim aos homossexuais perseguidos durante o período Nazi.
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