Foto de Mads Nissen, ganhadora do World
Press Photo de 2014. / REUTERS
ISABEL FERRER Amsterdã
Jon e Alex, dois homossexuais de 25 anos
num momento de intimidade em São Petersburgo (Rússia), são os protagonistas da
foto do ano de 2014, na opinião do júri do World Press Photo, o
mais prestigioso prêmio fotográfico mundial. O autor é o dinamarquês Mads
Nissen (1979), que fez uma foto “esteticamente poderosa, e [que] tem
humanidade”, nas palavras de Michele McNally, presidenta do júri e diretora de
fotografia do The New York Times. Publicada pelo
jornal Politiken (Dinamarca), a imagem é o resultado do trabalho de
Nissen sobre a homofobia na Rússia, país que aprovou em 2013 uma lei
proibindo “a apologia de relações sexuais que não sejam as tradicionais”. O
fotógrafo receberá 10.000 euros (cerca de 32.500 reais) e uma câmara reflex
digital com um jogo de lentes.
Nissen passou dois anos na Rússia documentando
os problemas que os homossexuais enfrentam. Visitou clubes e foi testemunha da
violência com que eram reprimidos pelas forças de segurança em plena rua.
Graduado em jornalismo gráfico, o dinamarquês trabalhou também dois anos em
Xangai observando as repercussões sociais e humanas do crescimento econômico
chinês. Suas fotos apareceram em veículos
como Times, Newsweek, Der Spiegel eStern.
Num ano como 2014, marcado pelaepidemia de ebola, a luta na Ucrâniae a tragédia do voo MH17, entre outras crises internacionais, o
retrato ganhador foi escolhido “porque não é preciso ir à guerra para ganhar
oWorld Press Photo”, segundo o fotógrafo canadense Donald Weber, integrante do
júri. “Também há maneiras sutis de abordar assuntos complexos, e a homofobia é
um problema grave na Rússia”, acrescentou. Outra jurada, Alessia Glaviano,
afirmou: “Os terroristas utilizam imagens fortes para fins de propaganda. Temos
de responder com algo mais sutil, mais intenso e refletido”.
O holandês Lars Boering, novo diretor do
concurso, espera transformá-lo em um “centro de pensamento do jornalismo
gráfico, e por isso escolhemos uma foto sobre o amor: é uma declaração de
intenções”. Falando ao jornal NRC Handelsblad, ele já tinha dito que não
pretende que a organização “se torne ativista, mas sim que participe dos
debates”. “O World Press Photo foi por muito tempo uma organização
neutra, algo que já não se encaixa nestes tempos.”
Para a edição de 2014, foram inscritas
97.912 imagens de 5.692 fotógrafos, procedentes de 131 países. Em 2013, as
regras de seleção foram alteradas para evitar retoques nas fotografias. O
ganhador de 2012, o sueco Paul Hansen, foi acusado de montar várias fotos até
conseguir o efeito desejado: comover o espectador ao mostrar um grupo de
adultos desesperados, carregando cadáveres de crianças, na Faixa de Gaza. A
investigação feita pelo próprio júri identificou apenas “retoques de cor”, mas
descartou fraude.
Superado o golpe, a competição decidiu
ampliar sua oferta em 2014, abrindo-se aos chamados projetos de longa duração,
que consistem em coleções de 24 a 30 fotos tiradas ao longo de três anos ou
mais. Pelo menos quatro deveriam ter sido registradas ou publicadas no ano
passado, segundo o regulamento. O poder de atração dessa proposta foi enorme,
porque ela reconhece um trabalho completo. Ao todo, apresentaram-se nessa
categoria 510 relatos fotográficos compostos por 14.583 imagens. A vencedora
foi Darcy Padilla (San Francisco, Califórnia) por sua galeria sobre “a complexa
história familiar de Julie Baird, em que há pobreza, AIDS, drogadição, mudanças
de domicílio, diferentes cônjuges, nascimentos, mortes, perdas e reencontros”.
Padilla foi além das condições mínimas do regulamento, já que acompanhou desde
1993 as desventuras de Julie Baird, que teve cinco de seus seis filhos levados
para abrigos infanto-juvenis. O projeto foi encomendado a ela pela Agência Vu,
criada na França em 1986 e hoje com cerca de 100 autores de 24 nacionalidades.
O vencedor de cada uma das categorias,
incluída a de longa duração, receberá 1.500 euros. O World Press
Photo é uma organização independente e sem fins lucrativos, fundada em
1955 em Amsterdã. Além dos prêmios anuais, apoia o fotojornalismo internacional
por intermédio de aulas ministradas por sua Academia. Patrocinado pela marca
Canon, o prêmio recebe também recursos da loteria holandesa.
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